Sei
Que, se os homens morrem de fome, aos milhares, enquanto outros morrem de indigestão, é porque não soubemos partilhar o trigo e amassar o pão para os nossos irmãos.
Sei
Que, se tantos e tantos jovens explodem na violência, querendo tomar à força aquilo de que estão privados, é porque nasceram por engano, do acaso de um abraço, ou então são amados como bonecas por pais imaturos, que colocam à sua frente o automóvel e o cachorro.
Sei
Que, se há homens que nada vêem nas páginas dos livros para além de sinais negros e mudos, é porque alguns guardam a sabedoria para eles, como um dom pessoal, exclusivo.
Sei
Que, se a Terra é propriedade e proveito para alguns, ainda que não seja senão campo de trabalho e de sofrimento para a maior parte, é porque os homens se esqueceram de que a Terra é para todos, e não apenas para os mais fortes.
Sei
Que, se alguns homens, é verdade, são mais ricos de inteligência, de saúde, de coragem, do que os outros, as suas riquezas são uma dívida para com os desprovidos, mas sei também que, demasiadas vezes, esta dívida aumenta, em vez de diminuir.
Sei
Que, se milhões de homens vivem sem poderem, livres e responsáveis, tomar o seu lugar na construção do Mundo, é porque alguns se julgam nascidos para senhores a quem fazem falta escravos, para poderem continuar a viver.
Sei
Que, se milhares de prisioneiros agonizam em campos de concentração, ou gritam, submetidos à tortura, é porque alguns homens se julgam senhores absolutos da verdade, e matam, lentamente, os corpos, para que morra o pensamento.
Mas sei também e admiro
Que alguns homens, por toda a parte, se levantam corajosos e, de pé, se lançam, seu corpo sangrando, nas lutas pela justiça e pela paz; mas também sei que, de um corpo que combate sem um coração que palpite, não pode nascer uma vitória, porque as lutas sem amor são lutas vãs: o sangue que elas fazem correr clama por outro sangue.
Michel Quoist, Falai-me de Amor, ed. Paulistas.