sexta-feira, 24 de outubro de 2008

DIPLOMACIA E PROFETISMO

Nos anos 60, o dramaturgo alemão Franz Hochut publicou uma peça teatral em que apreciava de forma extremamente crítica a atitude de Pio XII perante o Holocausto. Para quem não saiba Holocausto é o nome por que ficou conhecida a política de extermínio dos judeus (e não só), levada a cabo pelo nazismo em campos de concentração com câmaras de gás para provocar a morte e fornos crematórios para fazer desaparecer oa cadáveres. Queria-se eliminar os vivos e impedir o testemunho dos mortos. Tudo em nome da pureza da raça. Para tanto, a caça ao judeu foi prosseguida com afinco, não só na Alemanha, mas em todos os países que iam caindo sob as suas garras.
Ora, o que fez que, na opinião de muitos, Pio XII se tornasse cúmplice de tamanho horror?
O Papa não aprovou (melhor fora!) nem a guerra, nem o racismo e muito menos a perseguição dos judeus. Aliás, sobre o nazismo e o racismo, já em 1937 Pio XI explicitara o pensamento da Igreja na Encíclica Mit brennender Sorge que Hitler teve grande dificuldade em digerir. Mais: Pio XII fez tudo quanto pôde para salvar judeus: em Roma, as casas religiosas encheram-se de judeus perseguidos que, à sombra da Igreja Católica e por ordem do Papa, conseguiram salvar-se.
Perante isto, será justo acusar Pio XII? Não fez ele o que podia em favor dos judeus perseguidos? Infelizmente, não. O Papa sabia certamente o que se passava na Alemanha, e não ignorava certamente a política oficial de eliminação da raça judaica com a implementação da chamada “solução final”. E perante isso, agiu “diplomaticamente”: não denunciou, não alertou o mundo para o horror do que se passava. Por razões de prudência humana. Receando talvez a reacção doa esbirros que, a seu juízo, se podia traduzir em males ainda maiores.
Perante este silêncio, vêm ao espírito as palavras de Isaías que os judeus conheciam bem: “Feras dos campos, vinde comer, e vós todas as feras da selva. Os guardas estão todos cegos, nada vêem; são cães mudos, incapazes de ladrar; deitam-se a ressonar e só gostam de dormir... E são estes os pastores?” (Is., 56, 9-11).
O Papa é o chefe da Igreja, e é conhecido como o Vigário de Cristo. Cristo foi essencialmente um PROFETA – e nunca foi fácil a vida dos Profetas, porque, falando em nome de Deus, confrontam os homens com as verdades que doem. Diante de Pilatos, Jesus definiu claramente a sua missão: “Eu nasci e vim ao mundo para dar testemunho da verdade” (Jo., 18, 37). Dar testemunho da verdade é a primeira obrigação de qualquer cristão que, pelo Baptismo, recebeu a unção profética.
Foi aqui que Pio XII falhou. Sobrou-lhe em saber e jeito diplomáticos o que lhe faltou em ela profético. Não podemos saber o que teria acontecido se tivesse agido como Profeta. Sabemos que, se Cristo tivesse agido com jeito diplomático, não teria consumado na cruz a Redenção dos homens. Definitivamente, profeta não rima com diplomata.

© J. Tomáz Ferreira