terça-feira, 1 de julho de 2008

Paulo...

PAULO, APÓSTOLO DA LIBERDADE

O nosso Santo Padre Bento XVI proclamou o ano corrente como o ano do Jubileu Paulino. Destina-se a celebrar os dois mil anos do nascimento do Apóstolo que terá ocorrido (si vera est fama) mais ou menos pelo ano oitavo da nossa era.
Não me recorda o nome do autor francês que apelidou Paulo de “le premier après l’Unique”. É o maior elogio que se pode fazer de alguém e, pela parte que me toca, subscrevo-o em absoluto.
De todos os pilares da Igreja, que nos primórdios do cristianismo edificaram os alicerces do Povo de Deus, Paulo é, de longe, aquele de quem nos ficaram mais testemunhos escritos do seu pensamento e mais documentos sobre a sua acção apostólica: refiro-me às numerosas cartas que escreveu a várias comunidades cristãs, e lembro que grande parte do livro dos Actos dos Apóstolos é dedicada a descrever a sua acção evangelizadora. Não admira, pois, que não haja praticamente escrito de pensador cristão que se dispense de invocar em benefício do que afirma a autoridade de S. Paulo. E bom será que o grosso da actividade nas celebrações deste jubileu se centre em aprofundar a doutrina do Apóstolo.
Contribuindo modestamente para tão ingente tarefa, apraz-me lembrar de S. Paulo a mensagem de liberdade que perpassa em toda a sua evangelização. Poucas citações bastam para o comprovar.
Começaremos pelo princípio lapidar essencial na segunda Epístola aos Coríntios: “Onde estiver o Espírito do Senhor, aí está a liberdade” (2Cor. 3, 17). Eu sei (testemunhei) que muitas vezes se pretende a força da afirmação através duma capciosa interpretação: há situações, instituições, organizações, que, por definição, se consideram moradas do Espírito do Senhor – lembremos, a título de exemplo, a Santa Inquisição. Esta presença suposta garantiria a existência da liberdade, fosse qual fosse o modo de agir. Pela minha parte, já me vi na necessidade de lembrar que é a liberdade que é verificável, experimentável, e não o Espírito do Senhor. De modo que, em termos práticos, podemos inferir da liberdade verificada a presença invisível do Espírito do Senhor. E não vice-versa. Caso contrário, seriam livres as conversões e arrependimentos conseguidos coactivamente pela Santa Inquisição – já que nela, sento santa, era suposto residir o Espírito do Senhor…
Foi em defesa da liberdade que S. Paulo escreveu, preto no branco, a regra de ouro de toda a conduta moral: “Tudo o que é feito contra os ditames da consciência é pecado” (Rom., 14, 23). Foi certamente baseado neste ensinamento paulino que o grande Papa Inocêncio III viria a ensinar que não se deve agir contra a consciência, mesmo correndo o riso de excomunhão. Foi aplicando este princípio que o próprio Paulo ousou afrontar cara a cara aPedro, Príncipe dos Apóstolos, cuja autoridade, aliás, reconhecia. É ele próprio que o refere na Epístola aos Gálatas: “Mas quando Pedro veio para Antioquia, opus-me frontalmente a ele, porque estava a comportar-se de modo condenável”. (Gal., 2, 11).
Haverá mil maneiras de os cristãos celebrarem S. Paulo neste seu ano jubilar. Uma delas será certamente esforçarem-se por serem verdadeiramente homens livres.
J. Tomaz Ferreira