segunda-feira, 10 de março de 2008

Ensino e Empregabilidade - coisas da Ágora

Ágora
ENSINO E EMPREGABILIDADE

Há já alguns anos, o Director-Geral da Administração Pública (a velha DGAP) foi convidado por uma instituição universitária a ter um encontro com os alunos da dita, a fim de os elucidar quanto às saídas profissionais que na administração pública se abriam aos licenciados dos vários cursos ali ministrados. Perspicaz, o senhor Director-Geral fez notar que teria sido mais profícuo consultarem-no antes de lançarem os cursos: poderiam assim ter identificado as carências e criado os cursos que lhes davam resposta, em vez de andarem agora à procura de encaixe para os formados que eventualmente o seriam em áreas onde não havia carências, ou até de todo ausentes no horizonte de actividade da administração pública.
A história é antiga, mas veio-me à memória ao ouvir uma qualquer estatística sobre o desemprego actual. Parece que há, de facto, uma grande percentagem de licenciados no desemprego. E entre os que o não estão, vamos encontrar licenciados a exercer as mais diversas actividades que nada têm a ver com o grau académico que possuem: motoristas de táxi, “caixas” de supermercado, telefonistas de call center… - tudo profissões respeitáveis, mas em que os requisitos para um bom desempenho não exigem por certo o investimento pessoal que uma licenciatura requer, nem os recursos com que o contribuinte financia o ensino superior.
O desemprego desta mão de obra, em princípio altamente qualificada, começa por ser um drama para os próprios que o sofrem, mas é também um problema para o país. Um problema que é a consequência natural da errada política de educação dominante (de resto, parece que toda a política de educação dos últimos 30 anos tem sido um erro continuado).
Depois da esquálida penúria universitária do Estado Novo, as universidades em Portugal surgiram com a abundância de cogumelos em tempo de chuva. De tal modo, que é hoje difícil encontrar alguém que, além do título que lhe dá a sua actividade profissional, não ostente também garbosamente o de “Professor”. Como aquele jurista (político) que numa faculdade de direito confundia, presidindo a um júri de exames, sufrágio indirecto com voto por correspondência…
E veio uma profusão inominável de cursos os mais diversos – com a respectiva licenciatura – cursos que têm nomes pomposos, mas perante os quais o mais desprevenido pergunta perplexo “para que é que isto serve”. E não se vê. Consulte o leitor a lista de licenciaturas providas pelas universidades portuguesas: são muitas centenas. Se puder, compare com o que se passa, por exemplo, em Espanha. E tire as suas conclusões.
Estes são apenas alguns dos aspectos que explicam o drama de um país que chora com falta de mão de obra qualificada, mas que está cheio de “doutores”, titulares de um canudo vazio de utilidade outra que não seja o direito que confere ao seu possuidor de ser chamado “senhor doutor”.
Citizen Kane

Ágora (assuntos sociais e politicos)